Ninguém engana a vida


A gente se acostuma
A gente se acostuma a acordar de manhã, sobressaltado porque está na hora.
A tomar café correndo porque está atrasado.
A ler jornal no ônibus porque não pode perder o tempo da viagem.
A comer sanduíches porque já é noite.

A cochilar no ônibus porque está cansado.
A deitar cedo e a dormir pesado sem ter vivido o dia.
A gente se acostuma a abrir a janela e a ler sobre a guerra.
E aceitando a guerra, aceita os mortos e que haja números para os mortos.
A gente se acostuma à poluição.
A luz artificial de ligeiro tremor.
Ao choque que os olhos levam na luz natural.
A contaminação da luz natural.
A lenta morte dos rios.
E se acostuma a não ouvir passarinhos, a não colher frutas do pé, a não
ter sequer uma planta.
A gente se acostuma a coisas demais, para não sofrer.
Em doses pequenas, tentando não perceber.
Vai afastando uma dor aqui, um ressentimento ali, uma revolta acolá.
A gente se acostuma para poupar a vida.
Que aos poucos se gasta, e que, de tanto acostumar, se perde de si mesma.
A vida é uma oportunidade, agarre-a;
A vida é uma beleza, admire-a;
A vida é um desafio, enfrente-o;
A vida é um hino, cante-o;
A vida é a vida, defende-a.

(Madre Teresa de Calcutá)

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