ESCAFANDROS CARNAIS

ANTE OS DESAJUSTES ATUAIS - CONTINUAÇÃO
A REBELIÃO DOS PEDINTES J. Herculano Pires (Irmão Saulo)
Assistimos hoje, no mundo, à rebelião dos pedintes. Milhões de criaturas que pediram reencarnações de provação, vindo à Terra para descarregar suas consciências atormentadas, rebelam-se contras as condições que elas mesmas solicitaram. Ao mergulhar no plano da matéria densa, em seus escafandros carnais, esses espíritos sofredores reencontram o clima de suas antigas paixões, de seus anseios frustrados, de suas ilusões desfeitas e desejam repetir as tentativas do passado. Mas a verdade é que agora estão atrelados ao carro das provas, com a finalidade de se libertarem dos anseios egoístas, preparando-se para a civilização do altruísmo que já começa a alvorecer no planeta.
Estamos numa hora de transição. Temos de deixar os nossos erros no passado e avançar corajosamente para o futuro. Não é fácil alijar na estrada o fardo das velhas pretensões. Por outro lado, a vida de hoje oferece facilidades novas, perspectivas que no passado eram impossíveis e que agora fazem renascer as tentações antigas com maior violência. São os juros da dívida antiga, exigindo maior esforço dos devedores que, embriagados com a volta à condição corporal, esquecem-se dos compromissos espirituais assumidos para essa experiência.
Falta-lhes a capacidade de compreender de pronto a nova situação. Não obstante, todos eles trazem no íntimo as advertências do plano superior, prontas a brotar do inconsciente quando ajudados pelos companheiros terrenos que possuem a mente iluminada pelos princípios renovadores do espiritismo. É por isso que procuram intuitivamente o socorro espírita. Mas, se ao invés de compreensão, encontrarem em nosso meio a rejeição e a reprimenda, sentirão aumentar a revolta e o desespero que os afligem.
Daí a recomendação de Emmanuel no sentido de os recebermos com atenção e carinho, compadecendo nos deles, antes mesmo de ouvi-los. Temos de ter compreensão para ajudar os que não compreendem. Se formos capazes de amá-los, ao invés de censurá-los, poderemos dar-lhes a ajuda que nos pedem. E o Alto secundará os nossos esforços de fraternidade. Suportemos a galhofa, a ironia, a zombaria com que nos desafiam. Toleremos as suas impertinências, como outros já nos toleraram. Encaremos todos eles como irmãos que nos pedem amor, atenção e carinho, pois só assim os ajudaremos, ajudando-nos a nós mesmos.
É claro que não devemos acolhê-los para incentivar-lhes o apego às velhas paixões. Todos necessitamos sem exceção –, na vida terrena, de apoio afetivo e corrigenda. A ação dupla do freio e da espora, como ensina Lázaro, é que nos leva a saltar os obstáculos da prova.
A rebelião dos pedintes exige dos pais, dos educadores, dos orientadores religiosos – e sobretudo dos espíritas – uma atitude de permanente disponibilidade afetiva, de coração aberto, e ao mesmo tempo de mente vigilante. Não podemos, por amor sem controle, auxiliá-los na rebelião.
Essa atitude não é fácil de ser mantida, pois os pedintes rebeldes nos acusarão de crueldade e atraso, sempre que nos opusermos aos seus abusos. E terão ao seu lado familiares que os apoiam. Mas se tivermos amor em nossos corações, venceremos, pois nosso amor despertará na consciência rebelada a lembrança dos compromissos assumidos no mundo espiritual. Artigo publicado originalmente na coluna dominical "Chico Xavier pede licença"  do jornal Diário de S. Paulo, na década de 1970.

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