A MENINA E O PÁSSARO
“Obrigado, menina. Eu tenho que partir. É preciso partir
para que a saudade chegue e eu tenha vontade de voltar. Longe, na saudade,
muitas coisas boas começam a crescer dentro da gente.”
... De algum lugar, ele haveria de voltar. À noite, a menina ia para a cama com
saudades, mas também com a esperança do reencontro renovada. ... Ah! Mundo
maravilhoso que guarda, em algum lugar secreto do Universo, em plena liberdade,
o pássaro encantado que se ama... E que um dia, com certeza, vai voltar... VALE A PENA LER E REFLETIR, NÃO PRENDA QUEM
VOCÊ AMA!
Era uma vez uma menina que tinha um pássaro como seu melhor
amigo. Ele era um pássaro diferente de todos os demais: era encantado. Se a
porta da gaiola estiver aberta, os pássaros comuns vão embora, para nunca mais
voltar... Mas o pássaro da menina voava livre e vinha quando sentia saudades...
Suas penas também eram diferentes. Mudavam de cor. Eram sempre pintadas pelas
cores dos lugares estranhos e longínquos por onde voava. Certa vez, voltou totalmente
branco, cauda enorme de plumas fofas como o algodão.
“Menina, eu venho de montanhas frias e cobertas de neve,
tudo maravilhosamente branco e puro, brilhando sob a luz da lua, nada se
ouvindo a não ser o barulho do vento que faz estalar o gelo que cobre os galhos
das árvores. Trouxe, nas minhas penas, um pouco do encanto que eu vi, como
presente para você...” E assim ele começava a cantar as canções e as estórias
daquele mundo que a menina nunca vira. Até que ela adormecia, e sonhava que
voava nas asas do pássaro. Outra vez ele voltou vermelho como fogo, penacho
dourado na cabeça. “Venho de uma terra queimada pela seca, terra quente e sem
água, onde os grandes, os pequenos e os bichos sofrem a tristeza do sol que não
se apaga. Minhas penas ficaram como aquele sol e eu trago canções tristes
daqueles que gostariam de ouvir o barulho das cachoeiras e ver a beleza dos
campos verdes.”
A menina amava aquele pássaro e podia ouvi-lo sem parar, dia
após dia. E o pássaro amava a menina, e por isso voltava sempre. Mas chegava
sempre a hora da partida. Chorava a menina e chorava o pássaro. E a menina
pediu ao pássaro que não mais partisse. Eu vou lhe contar um segredo, disse-lhe
o pássaro: as plantas precisam da terra, os peixes precisam dos rios, nós
precisamos do ar... E o meu encanto precisa da saudade. É aquela tristeza, na
espera da volta, que faz com que minhas penas fiquem bonitas. Se eu não for, não haverá
saudades. Eu deixarei de ser um pássaro encantado e você deixará de me amar. Assim
ele partiu. A menina sozinha, chorava de tristeza à noite. E foi numa destas
noites que ela teve uma ideia malvada.
Se eu o prender numa gaiola, ele nunca mais partirá; será meu para sempre. “Nunca
mais terei saudades, e ficarei feliz”.
Com estes pensamentos comprou uma linda gaiola e ficou à
espera. Finalmente ele chegou maravilhoso, com suas novas cores, com estórias
diferentes para contar. Cansado da viagem, adormeceu. Foi então que a menina,
cuidadosamente o prendeu na gaiola para que ele nunca mais a abandonasse. E
adormeceu feliz. Foi acordar de madrugada, com um gemido triste do pássaro. Ah!
Menina... o que você fez? Quebrou-se o encanto. Minhas penas ficarão feias e eu
me esquecerei das estórias... Sem a saudade, o amor irá embora... A menina não
acreditou. Pensou que ele acabaria por se acostumar. Mas isto não aconteceu. O
tempo ia passando, e o pássaro ia ficando diferente. Caíram suas plumas, os
vermelhos, os verdes e os azuis das penas se transformaram num cinza triste. E
veio o silêncio. Também a menina entristeceu. Não, aquele não era o pássaro que
ela amava. E de noite ela chorava pensando naquilo que havia feito ao seu
amigo... Até que não mais aguentou e abriu a porta da gaiola. “Pode ir, pássaro,
volte quando quiser...”. “Obrigado, menina. Eu tenho que partir. É preciso
partir para que a saudade chegue e eu tenha vontade de voltar. Longe, na
saudade, muitas coisas boas começam a crescer dentro da gente.”
E o pássaro partiu. Voou para lugares distantes. A menina
contava os dias, e cada dia que passava a saudade crescia... Que bom, pensava
ela, meu pássaro está ficando encantado de novo... . E colocava flores nos
vasos à espera do seu amigo... Sem que ela percebesse, o mundo inteiro foi
ficando encantado como o pássaro. Porque, em algum lugar ele deveria estar
voando. De algum lugar, ele haveria de voltar. À noite, a menina ia para a cama
com saudades, mas também com a esperança do reencontro renovada.
Ah! Mundo maravilhoso que guarda, em algum lugar secreto do Universo, em plena
liberdade, o pássaro encantado que se ama... E que um dia, com certeza, vai
voltar...
Equipe de Redação do Momento Espírita, com base em história de Rubem Alves, constante
do livro A Menina e o Pássaro Encantado, ed. Loyola.
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